sexta-feira, 16 de outubro de 2009

intolerância & intolerância

Intolerância & intolerância

[...]

- Desculpe, mas o sr. não se qualifica financeiramente para o visto. - disse a velha maldita.

Eu me vi cego de tanto ódio, senti o sangue subindo e borbulhando dentro da minha cabeça. Minha orelha parecia que ia pegar fogo instantaneamente de raiva. A velha maldita, de cabeça branca, a qual não conseguia sequer falar a minha língua direito. A vontade que eu tinha era de esmurrar aquele vidro que nos separava. Aquele vidro era uma metáfora para a barreira intransponível entre eu e aquela merda de visto.

Senti minhas veias da testa saltando e pulsando como um tumor, sugando todo meu sangue.

Fechei os olhos. Vi tudo em preto e branco. Em um movimento inesperado, desferi um soco no vidro que nos separava, o quebrando instantaneamente. A velha maldita, estática, com cara de espanto não tomou nenhuma ação. Alcancei, com minha mão direita, seu pescoço frágil e enrugado. Apertei até sentir seus últimos suspiros se esvaírem pelo ar. Meu braço totalmente cortado pelo vidro, mas não sentia dor. Nesse momento os seguranças mal treinados acertavam minhas costas com balas de .38 enferrujados. Eu não sentia dor. Minha raiva era tanta que bloqueava os meus outros sentidos.

Abri meus olhos.

- Senhor, vou pedir para que se retire.

Eu estava lá, parado. Suando frio de raiva. Imaginando jeitos de esvair minha raiva.

Peguei meus documentos e meus dólares. Saí da sala. "Ande pelos tijolos, sempre a sua direita", disse o segurança na entrada daquela casa profana. Esses tijolos.. foram construídos para que pessoas do terceiro mundo andassem lá, com angústia e nervosismo na ida e alívio ou revolta e mais angústia na volta. Os tijolos estavam lá por um motivo, não foram simplesmente colocados lá. A caminhada era terrível.

Acendi um cigarro neste mesmo caminho até os portões. "Proibido fumar" dizia o aviso. Foda-se. Eu já estava de saída mesmo. Para sempre. O segurança nos portões me chamou a atenção e falou para eu apagar o cigarro. Dei um último trago no cigarro, baforei na cara dele e saí de lá, de uma vez por todas. Me senti um parente de Travis Bickle. Um irmão de William "D-Fense" Foster. Eu sentia necessidade de matar. Matar aqueles porcos malditos que se julgam superiores. Porcos com burocracias e procedimentos. É tudo muito ridículo e agoniante.

Estava na merda. Precisava sair do país de qualquer maneira. Minha cabeça tinha um preço muito alto. Mesmo sendo um cretino corajoso, eu não podia ignorar o fato de que estavam atrás de mim, estavam querendo meu sangue. Queria arrancar minha cabeça e certamente a colocar em alguma parede como um maldito troféu. O que havia feito para merecer tudo isso? Foda-se, ninguém precisa saber. Mas eu o havia feito. E agora eu precisava escapar. Mas por causa de uma velha filha da puta, meu plano se foi por água abaixo. Não me restava mais nada além de esperar a morte com um olhar apático. Mas se eu realmente tiver que ir, por que não ir em grande estilo?

É isso. Não tenho mais nada que me prenda. Eu só tinha esta chance de reconstruir minha vida e meu império em outro lugar e já era. Eu sabia que eles estavam atrás de mim naquele exato momento. Eu sabia.

Voltei para o carro. Abri o porta-malas. Peguei minha Remington 870. Escondi na minha jaqueta, ou pelo menos tentei. Essa escopeta é um monstro. Andei depressa em direção aos portões. Quando cheguei a uma meia distância, dois seguranças já haviam me visto e me julgado suspeito. Não foram tão rápidos. Tirei a escopeta da jaqueta e já empunhei contra meu ombro. Mirei no peito do primeiro. Certeiro. Ele caiu atirando seu .38 que merecia estar em um museu. O segundo tentou se proteger atrás da porta do carro. Inútil. O tiro da Remington atravessou a janela do carro e o acertou no rosto. Esse, caiu sem esboçar nenhuma reação. Corri em direção ao toldo e aos dois últimos seguranças mal treinados.

Corri como se tivesse protegido por armaduras impenetráveis. O segurança que estava mais perto de mim atirava incessantemente e errava todos os tiros. Até que um dos tiros me acertou no ombro. Mas pouco importava. Eu já estava decidido a ir até o fim. Carreguei a Remington e avancei em direção ao segurança mais próximo. Atirei a primeira vez, no chão. Atirei a segunda, no abdome. Atirei a terceira, no peito. A essa altura, seu corpo já havia virado uma carcaça disforme, um prato feito para hienas, urubus e vermes.

Duas balas e um segurança restantes. Ele se escondia de mim na guarita. As pessoas corriam em volta de mim. Desesperadas. Gritando. Sensíveis demais. Cheguei perto da guarita, o segurança estava com um rádio na mão e carregando seu revólver, com cara de desespero. Abri um sorriso maléfico. Ele me implorou pela sua vida.

- Desculpe-me. Mas o senhor não é economicamente viável para sobreviver.

Apertei o gatilho.

Sua cabeça parecia uma tupperware. E dentro dela, geléia de morango. Nas paredes também.

Olhei para a janela da guarita que dava acesso ao outro lado do portão. Vários seguranças correndo em minha direção. Mas não precisava mais de nada. Já havia executado o que meu instinto pedia.

Último tiro. Guardei para o 'grand finale'. Encostei o cano da escopeta no meu queixo e apertei o gatilho. Adeus.

Um final triste? Não. Um final justo.

Uns dirão que é o fácil acesso às armas. Outros, videogames. E outros, bullying nas escolas.
Mas, na verdade, o motivo é outro: intolerância leva a intolerância.


--

"now something must be done
about vengeance, a badge and a gun
'cause I'll rip the mike, rip the stage, rip the system
I was born to rage against 'em"
rage against the machine - know your enemy

Nenhum comentário:

Postar um comentário