quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

i-nigma

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Maldito

minhas pálpebras estão pesadas. não consigo controlar.

estou sonhando? é tudo muito real.

[...]

estou jogado às traças. meu coração bate cada vez mais devagar. fui esquecido pela humanidade. minha respiração está ficando mais fraca.

não tenho a mínima idéia de onde esteja. só lembro que dormi profundamente e fui acordado da pior maneira possível: com choques elétricos. e não foram dois ou três, só para me acordar. foram vários choques, demorados e insuportavelmente fortes. o maldito não parava nem para rir. não creio que estava se divertindo. acho que era uma obrigação. algo que ele nasceu para fazer e estava executando com primor e excelência. nos pequenos intervalos dos choques eu percebi que ainda carregava minha Colt .45. era uma bela pistola. cromada e semi-automática. enquanto não estava tomando choques, eu tentava alcançá-la na parte de trás da minha calça, mas não conseguia. essa eu perdi sem nem tentar me defender.

desde então, conheci meu pior inimigo. eu o chamo de 'maldito'. por que é isso que ele é: um maldito.

desta primeira vez, não consegui ver direito o rosto dele. só vi que era uma figura imensa, bizarra e amedrontadora. era como se fosse feito de sombras e matéria orgânica empilhada sem forma. um amontoado de pedaços de carne. um boneco de sobras de açougue. algo muito escroto de se ver. era como se um corpo tivesse sido virado ao avesso e respirava normalmente mesmo assim. no começo eu sentia medo da figura dele. mas já estamos um tanto quanto íntimos. ele conhece minhas entranhas como ninguém.

digo isso sem ironia alguma.

sempre há a esperança de realmente ter sido esquecido por ele, mas a realidade vem como uma pá em direção à minha cabeça para me acordar e me mostrar que nada mudou. o maldito é imenso. é um cretino. um filho duma puta. um bastardo.

estou deitado no chão. vejo uma criança fugindo e gritando enquanto corre:

- ele tá vindo! ele tá vindo! não deixa ele me pegar, por favor!

a criança some.

então o maldito vem novamente, atrás de mim. incansável, persistente, determinado, com o mesmo olhar desvairado no rosto. estampando a loucura e a insanidade nos seus olhos negros e sem fundo. eu fico me perguntando como acontecerá dessa vez. se vai doer como nas outras vezes. se vai ser rápido. não posso dizer que me acostumei com essa situação pois toda vez em que acordo, ele inventa um novo jeito para fazê-lo. escutei seus passos ficarem mais próximos. empunhei a pistola, como toda vez tentei fazer desde a segunda vez. quando ele chega mais perto, eu descarrego a pistola. mas os tiros parecem nem encostar nele. não importa se eu atiro de longe ou de perto.

ele me agarra pelo pescoço e me levanta do chão. a pistola cai da minha mão. meu coração agora vai a mil. não consigo fazer nada para detê-lo. ele é muito forte. bem acima do que eu poderia chamar de normal. mas desde que fui acordado naquela noite, nada pode ser definido como 'normal'. enquanto estou suspenso no ar, eu o encaro. seus olhos negros não piscam. ele é como um predador em busca de sua presa. mas ele não faz isso por sobrevivência. ele parece ser impelido, coagido, obrigado a fazer tudo isso. então, desvio o olhar. eu posso ver um estilete - desses de escritório, igualmente cego - em uma de suas mãos. acho que já sei o que me espera. com meu corpo suspenso pelo pescoço por uma das mãos e o estilete na outra, ele começa o seu trabalho. ele rasga meu rosto inteiro com aquela ponta sem corte, o que aumenta minha dor em níveis nunca antes imaginados por mim. ele não faz distinção de pele, nervos, cartilagem, carne, olhos. ele simplesmente dilacera e fatia tudo.

(sabe, o olho é composto por muitos nervos. você sabe que enfiar o dedo sem querer no olho dói pra caralho, mas não imagina a dor que uma lâmina cega pode causar quando vem rasgando de cima a baixo seu globo ocular.)

eu queria desmaiar para não sentir mais dores. mas ao contrário disso, não desmaiei. fiquei sentindo cada pedacinho daquela sensação sem precedentes. eu fico cego, urrando de dor, com sangue sendo jorrado pelos novos buracos que o maldito me deu de presente. mas não para: ele continua rasgando meu rosto até chegar no osso. minha boca, meus lábios, até minha língua: tudo está em retalhos. eu devo parecer uma mistura de pano de chão velho com o Frankenstein depois de se barbear com um ralador de queijo. eu gritava. era um misto de urros com choro. não há nenhum fodão na vida que não ceda nessas situações. eu duvido.

então, ele me joga no chão, com toda a sua força. eu devo ter quebrado algumas costelas. digo isso pelo barulho de ossos trincando e pela dor insuportável. é como se algo tivesse perfurando meus pulmões e me impedia de respirar. para melhorar, o maldito me chuta na boca do estômago ao ponto de eu deslizar alguns centímetros no chão. eu perco o fôlego que já não tinha. tento puxar o ar mas ele não vem. eu apago.

[...]

agora vem a parte que eu já cansei de ver.
um céu azul sem nuvens e um campo verde sem fim.

de repente, tudo fica escuro novamente.
e então, começa tudo de novo.

[...]

o mesmo papo furado.
esquecimento, traças, respiração fraca e coração batendo devagar.

ele vem com o mesmo olhar insandecido e determinado. com o mesmo olhar desvairado no rosto. estampando a loucura e a insanidade nos seus olhos negros e sem fundo. eu pego a pistola, descarrego nele e nada. ele parece um maldito fantasma nessas horas. tudo de acordo com o script.

o maldito me pega pelo pescoço, me levanta, abre a minha boca com a outra mão. a pistola cai no chão. eu penso em mordê-lo, mas ele é mais rápido do que eu. ele segura no meu maxilar e puxa para baixo com toda a sua força. sinto o maxilar se quebrando. um grande barulho ecoa dentro da minha cabeça. como se estivesse estalando o pescoço, mas, junto do estalo, uma dor insuportável. nervos, músculos, carne e pele sendo cortados e ossos se partindo. mas o maxilar não se solta de primeira. ele fica solto, pendurado. então o filho da puta começa a puxar e empurrar para os lados até se soltar do resto da minha cabeça. o maxilar então se solta, como uma peça de lego que encaixava perfeitamente no resto do conjunto.

tente imaginar como eu gritava de dor nessa hora e, falando nisso, como o som deve soar quando você não tem um maxilar.

o maldito joga o maxilar no chão. eu fixo meu olhar naquilo e consigo até ver as obturações que fiz no decorrer da minha vida. não escovava os dentes tão bem assim. amálgama e tártaro estavam lá. e eu me dei conta que nunca tinha visto meus dentes de um ângulo tão bom.

não contente, o maldito agarra minha língua e puxa em direção às suas costas. como se tivesse dando partida em uma serra elétrica. agora, a língua é totalmente vascularizada, você sabe disso. mas não imagina a quantidade de sangue que esse tipo de lesão causa. eu comecei a engasgar com rios de sangue. meu próprio sangue. eu tentava botar para fora mas não tinha como. não tinha nem como engolir. já pensou em engolir algo sem usar a língua? era um misto de tosse com engasgues.

ainda suspenso no ar por uma de suas mãos, ele puxa uma faca enferrujada. temo pelo pior. mas ele não enfia a faca em mim. ele faz um corte horizontal na parte de trás da minha cabeça. estou quase desmaiando de dor. sinto o sangue escorrendo na nuca e costas. pela quantidade de sangue descendo da minha cabeça, imagino que o corte tenha sido profundo. então, ele larga a faca, agarra o meu cabelo e começa a puxar como se tivesse abrindo uma tangerina. de repente sinto meu escalpo sendo descolado do crânio, eu começo a emitir sons de dor (que nessas alturas não podem nem ser chamados de gritos). ele puxa até sair o couro da testa até parecer uma máscara de halloween e então começo a apagar. ele me solta e eu caio no chão, semi-morto. eu apago.

[...]

não sei quanto tempo duram essas visões.
a mesma merda de céu. a mesma merda de campo verde.

escuridão.
vai começar de novo.
merda.

[...]

a criança vem correndo novamente e para a alguns metros de mim.

quase sem fôlego ela diz:

- o senhor tem uma arma, por que não a usa contra ele?

- eu tentei, filho. mas ou ele é imortal ou as balas nem encostam nele.

- o senhor não entendeu. não é para usar assim! é contra ele!

o garoto desaparece.

eu puxo a pistola e espero o maldito.

o maldito vem com sua fúria implacável. atiro todas as balas que eu pude mas nada parece ter efeito. em sua mão direita, um facão ou machete. totalmente enferrujado. ele me acerta com a mão fechada na lateral da cabeça para me atordoar. eu caio e fico imóvel no chão sem ter nenhum poder de reação. ele se ajoelha perto de mim e, com a precisão de um cirurgião cego com mal de parkinson operando com uma chave de fenda, abre minha barriga com uma só investida. eu urro de dor e tento evitar que ele continue. mas ele me segura pelo peito e não me deixa fazer nada. o maldito começa a puxar meus intestinos para fora. nessa altura eu já estava tendo convulsões de dor e não tinha forças nem mais para gritar. ele então puxa alguns metros de intestino para fora e enrola no meu pescoço. maldito seja. doentio e perturbado. como um experiente marinheiro, ele dá um nó em volta do meu pescoço e começa a me sufocar. ele se levanta e fica me observando com os mesmos olhos sem expressão nenhuma a não ser pela insanidade. nas últimas das minhas forças, tento desatar o nó feito pelas minhas tripas. mas foi em vão. o escorregadio e sangrento material que compõe meus intestinos não ajudou muito. escorregava demais para ser desatado. minha vista foi escurecendo. ele permanecia lá, parado. eu apaguei.

[...]

céu azul.
campo verde.

escuridão.
eu odeio o maldito.

[...]

o maldito pirralho aparece novamente para me infernizar.

- você está fazendo errado!

- por que você não me conta como fazer então, seu filho da puta?! tô cansado dessa merda toda!

- olha, ele vive dentro de você. você é ele. ele é você!

- do que você está falando?!

o garoto para de falar e com um olhar de pânico no rosto, ele dá alguns passos para trás olhando para frente. escuto algo zunir no ar. um facão passa do lado da minha cabeça e acerta o moleque no meio da testa. ele cai para trás e sangra muito. por um momento eu pensei "bem feito, filho da puta". mas lembrei que não tinha tempo para isso. olho para trás, o maldito se aproxima.

ele vem novamente. não tenho tempo nem de respirar e me recuperar da morte anterior, apesar de não sentir mais dores. o maldito me empurra. caio no chão com as costas para cima. o demônio levanta meus braços acima da minha cabeça e me amarra os pulsos juntos. ele me levanta e me prende em algo que parece uma haste horizontal que está no alto. ele vai embora por alguns segundos e volta com alguns ganchos, ou picadores de gelo. não consigo distingüir. os ganchos tem cordas presas em suas extremidades. as cordas parecem estar atadas a algum tipo de dispositivo maléfico. o maldito se vira para mim e começa a tortura da vez:

ele, com a sutileza de um avião cargueiro da segunda guerra mundial em uma vidraçaria suíça, enfia os ganchos no meu tórax. um por um, ele os prende por trás das costelas. a cada investida eu grito mais do que meus pulmões podem aguentar. nos últimos eu não esboçava mais reação alguma. três ganchos de cada lado, com as cordas viradas para fora. eu grito descontroladamente, pela dor e desespero. ele vai embora. eu fico lá, gritando em meio a escuridão. não sei o que vai acontecer agora. não saber o que vai acontecer é pior do que saber. foi quando eu escutei um barulho de maquinário. as cordas começaram a serem puxadas pros lados até que os ganchos sofreram resistência dos meus ossos. eu urrava de dor. a máquina parou. as cordas estavam esticadas e firmes. puxando meu tórax para fora, como se meu peito fosse ser rasgado e aberto no meio. foi quando a máquina fez um barulho alto e, de uma vez, puxou com toda a força do mundo. meu tórax explodiu. eu vi meus órgãos caindo, meus pulmões estourando, meu coração batendo. o sangue que jorrava podia abastecer um banco de sangue por dias ou semanas.

nessa altura, eu já estava pendurado pelos braços, sem fazer força alguma com as pernas. eu apaguei.

[...]

céu azul.
campo verde.

escuridão.

[...]

já passei por vários estágios: no começo eu fiquei desesperado. não entendia o que estava acontecendo (e ainda não entendo). eu tentava descobrir um jeito de sair. tentei lutar contra o maldito. mas não consegui fazer nada que o impedisse de me matar várias vezes. então comecei a chorar. não conseguia me acostumar com essa situação. quando você se depara com um problema que não há solução e você se consola de algum jeito, você começa a rir de nervoso. é revoltante. mas já passei desse estágio também. fiz o looping em todos os estágios várias e várias vezes.

não sei quantas vezes isso já aconteceu. já perdi as contas. já tive os olhos arrancados das órbitas, já tive as mãos e pés amputados, já fui degolado, já fui queimado, já fui afogado, já fui enterrado vivo, já fui perfurado por 90 facas de cozinha, já fui arremessado de uma altura imensurável, já fui atropelado, pisoteado, crucificado etc. não sei o que aconteceu comigo. devo ter morrido e ido para o inferno, onde a penintência deve ser eterna.

queria que tudo mudasse. não aguento mais essa realidade. o que será que aconteceu?! eu já morri tantas vezes que já cansei de viver. queria que tudo mudasse. eu queria morrer e ficar morto. não faço mais questão de sair dessa e continuar minha vida. o esforço para se manter lúcido é possivelmente maior do que a vontade de viver.

algo precisa ser feito.

aquele filha da puta vem novamente em minha direção. qual será sua escolha? uma serra elétrica? um machado medieval? um lançador de granadas? uma máquina de tortura da inquisição? eu não ligo. eu não quero saber. só quero que ele se foda e me deixe em paz. esse filho de uma puta sadístico dos infernos. tem a alma tão negra que nem as profundezas aceitam-no.

mas, não. o maldito não me deixa em paz. ele já vindo em minha direção novamente, olhando fixamente para mim como um médico nazista deveria olhar para um judeu pensando que tipo de experiência malévola ele fará com aquele pedaço de carne falante.

eu levantei, limpei o suor da testa. eu o encarei com a certeza de que eu ia morrer novamente, mas com o ímpeto de alguém que estava cansado daquela bosta toda e ia fazer o possível para dificultar uma nova tentativa de ser sacrificado.

uma voz ecoou na minha cabeça.

"ele vive dentro de você" disse o moleque.

o maldito parou a três passos de mim.

"ele é você!" disse o moleque.

eu peguei minha pistola da parte de trás da minha calça. e pela primeira vez, a feição no rosto do maldito mudou. de insanidade e irracionalidade seu rosto transpareceu surpresa.

"você é ele!" disse o moleque.

é isso.

coloquei a pistola embaixo do queixo. sorri para aquela aberração que não estava viva nem morta.

o maldito entrou em pânico. até deixou cair o que quer que estava carregando para me fazer sangrar novamente. deu alguns passos para trás.

era isso. era exatamente isso.

e em um descuido meu, ele pulou em cima de mim para tentar evitar o pior. ele fedia muito, como carniça. ele tentava arrancar a pistola da minha mão. eu não podia com ele. o maldito era muito forte. mas eu não podia desistir. havia feito algo que nunca tinha conseguido antes. conquistei o medo e o pânico daquela criatura infernal. caímos no chão. uma mão em cima da outra. quatro mãos brigando por uma arma que não havia causado efeito algum naquele filho da puta até esse dia. a arma disparou contra o vento. ele batia minhas mãos no chão até eu largar a arma. mas eu não a largava. a pistola disparou novamente. eu estava decidido. rolávamos no chão. com uma mão ele tentava tirar a pistola de mim e com a outra me socava no rosto com tanta força que eu sentia meu cérebro sacudir. eu não podia tentar revidar. já estava difícil demais segurar a arma com as duas mãos. eu só podia aguentar e convalescer, golpe atrás de golpe. ele sacudia minha cabeça e a batia contra o chão. então, o maldito conseguiu colocar os joelhos sobre meu peito para me bater mais ainda, até eu desistir do meu plano que parecia ser infalível. eu já estava totalmente tonto nessa altura. estava prestes a ceder. mas não podia. meu nariz jorrava sangue. meus olhos estavam tão inchados que eu mal conseguia ver. já estava tudo preto. foi quando ele largou da arma para tentar dar um último golpe de misericórdia: o maldito juntou as duas mãos em cima de sua cabeça para me acertar um soco que equivalia a uma bomba atômica no meio da face. percebi, naquele milésimo de segundo, a chance que precisava.

seus braços estavam vindo em minha direção há mil quilômetros por hora. mais rápido que a velocidade da luz.

"é agora ou nunca." pensei

antes que seus dois punhos juntos conseguissem alcançar meu rosto, coloquei a arma embaixo do queixo.
tudo ficou em câmera lenta.

agora sim. era isso. era exatamente isso.

atirei.

acordei.

meu deus. seria tudo pesadelo? o que aconteceu? olhei em volta. eu estava em uma cela. não tinha janelas. só um pequeno visor de vidro transparente com uma tampa na porta. espere um minuto. eu... eu estou em um hospital psiquiátrico. minha roupa.. eu estou com aquelas malditas roupas que dão para pacientes em hospitais. tento me levantar mas não consigo. estou preso a uma cama com cintos de couro apertados.

eu começo a gritar. talvez a realidade não seja tão pior quanto o maldito.

alguém abre a tampa do vidro na porta e me observa. então uma luz vermelha acende no quarto. um médico entra.

- como estamos hoje?

- quem é você? por que eu estou aqui?!

com um olhar desapontado e pensativo ele murmura:

- vejo que nosso tratamento não está surtindo efeito. vamos ter que aumentar a dose. a enfermeira em breve lhe visitará com a nova dose. tente descansar.

ele vira de costas para mim balançando a cabeça ainda com o ar desapontado e sai do quarto. a porta e a tampa do vidro se fecham. a luz vermelha se apaga.

espero mais alguns minutos sem poder me mover e, novamente, a tampa do vidro se abre, alguém me observa. a luz vermelha se acende. uma enfermeira entra no quarto com os braços para trás. ela é lindíssima. pele pálida. olhos pretos. maças do rosto rosadas. lábios carnudos com um batom vermelho sangue. ela sorri para mim e, assim, mostra seus dentes perfeitos e brancos. um sorriso perfeito. então ela põe os braços para frente e eu vejo uma seringa imensa em uma de suas mãos. um líquido transparente que deveria passar um ar de limpeza e pureza só me traz mais pânico. não sei o que tem lá. e o que quer que seja, não deve ser bom para mim. me desespero e começo a me debater na cama. peço, imploro, suplico-lhe para não aplicar aquilo em mim.

ela sorri mais uma vez e diz calmamente:

- não vai doer nada. feche os olhos e se tranquilize.

sua voz era suave. era exatamente como a voz de anjos devem soar. ela me tranquilizou bastante. nesse momento acreditei totalmente que não ia me fazer mal. ela era um doce. eu a amava. ela era perfeita. sem querer, eu deixo um sorriso aparecer no canto da minha boca enquanto estou de olhos fechados. sinto a picada no braço e nem me incomodo. sinto ela pressionando a seringa até o final e não ligo. ela me amava.

- pode abrir os olhos agora - disse ela novamente, com sua voz suave e perfeita.

antes de abrir totalmente os olhos, eu sinto algo me batendo no peito com muita força e instantaneamente depois, sinto uma dor quente. solto um grito que fez o hospital todo tremer.

abro os olhos rapidamente.

- oh não... NÃÃÃÃO!

era aquela criatura novamente.

era o maldito. ele estava do lado direito da cama. e a enfermeira do lado esquerdo, sorrindo. aquela vadia. eu sabia que ela estava aprontando algo. eu sempre soube. filha da puta!

ele, com uma investida só, enfia a faca novamente em meu peito e me rasga até o abdome. eu grito em todo o processo. mas não parece adiantar. ninguém vem até o quarto, que nessa altura, estava fechado e com a luz vermelha apagada. o maldito, então, força a abertura do rasgo que ele provocou até meu corpo parecer uma bolsa de couro. ele derrama algum líquido dentro de mim que causa muita dor. pelo cheiro, eu diria que era álcool. eu gritava de dor. eu olho para o outro lado, a enfermeira está acendendo um cigarro com um fósforo. eu esboço um grito. mas não dá tempo. ela jogou o fósforo ainda aceso dentro de mim. eu entrei em combustão instantânea. ela ria enquanto eu queimava como um churrasco texano. o maldito me olhava com os mesmos olhos de sempre. eu apaguei.

[...]

céu azul.
campo verde.

escuridão.

[...]

I'll beat you with your spinal cord
Split your skull in two
I'll feast on your intestines
There's nothing I can't do
I'll rip your heart out of your chest
Watch it beat as you cry
I revel in your agony
I violate and make you die

Iced Earth - Violate